Eu me masturbo na frente do espelho, entre as pernas a fenda que é a origem do mundo, vejo no reflexo a buceta reluzindo molhada, e quando gozo vem um fogo queimando de baixo pra cima, abro os olhos porque quero me ver gozando.
O que vejo é uma mulher com aura de labareda, de pernas abertas como a própria Pachamama, o suco que escorre de mim é quente e viscoso, a carne dos lábios treme, a boca está entreaberta aspirando o hálito do mundo, meu coração bate tão forte, no ritmo surdo do núcleo da terra, o que vejo é tão lindo que escorre um amor quente por mim mesma e me pergunto como pude um dia duvidar da minha beleza, essa que, eu sinto e sei agora, vem de dentro.
Passo ainda alguns minutos deitada depois do gozo, sentindo tudo, a respiração acelerada, o corpo quente, os pensamentos claros. Percebo o quanto de tempo e energia gastei odiando meu corpo, achando defeito, desejando ser outra, percebo o quanto aceitei migalhas que me validassem, que me fizessem sentir escolhida.
Olho o relógio, estou atrasada, não tenho tempo de tomar banho, enfio um dedo dentro de mim e depois esfrego meus sucos atrás da orelha, quero sair com esse cheiro de buceta e saliva, esse vai ser meu perfume, visto um vestido solto, sem sutiã, e o roçar do tecido nos meus mamilos me excita, meu corpo inteiro ainda aceso.
Meu corpo é capaz de tudo isso, penso, abismada, e tomada pela força de alegria que brotou da buceta e preencheu o corpo inteiro, me vejo uma última vez no espelho antes de sair, vejo com clareza além do reflexo, vejo a força e a beleza que me habitam, fazia tempo que não me sentia assim, se é que alguma vez senti. Terapia e orgasmos operam milagres, digo pra mim mesma.
Chego no samba e minhas amigas já estão lá, com cara de preocupadas, ele tá aqui, uma delas sussurra e pela primeira vez em meses a menção do nome dele não me assusta nem abala, ele está aqui, eu também, tão aqui, nesse presente, nesse corpo, que o passado onde ele não me quis, onde me trocou por alguém que na época eu considerei mais desejável já não existe mais. Dou de ombros, pego uma caipirinha, danço.
Minhas amigas ficam surpresas, uma delas pergunta: você fez alguma coisa? tá tão bonita hoje, sorrio sentindo nos lábios a doçura do açúcar e da paz por dentro da minha pele, um ritual de autocuidado, respondo. Ele me vê e vê que o vejo, mas dessa vez não vou falar, não por orgulho, mas por falta de vontade, não é joguinho, mas ele assume que é e, acostumado a ter poder sobre mim, vem falar comigo com pose de vencedor.
Faz perguntas triviais, que respondo por educação, procurando pra além do ombro dele uma saída, é aí que ele me elogia, um elogio vazio que eu teria morrido pra ouvir meses atrás e agora que finalmente recebo não significa nada, de repente o rosto dele se torna um estranho, como um dia eu corri atrás desse rosto, desse sorriso falso, desses dentes tortos?
Rio sem querer e ele pergunta do que estou rindo, começando a ficar irritado (eu sei porque enquanto estávamos juntos aprendi a ler cada expressão dele na esperança de um dia encontrar uma que fosse de amor), e resolvo pela primeira vez ser absolutamente sincera e dizer o que estou pensando: eu não gosto de você, talvez nunca tenha gostado de verdade, só queria que você me escolhesse.
Primeiro o choque naquele rosto, depois a boca balbuciando qualquer coisa, quem sabe vai me chamar de doida, mas não tenho tempo pra descobrir, começou a tocar um samba que eu gosto, digo licença e vou dançar.
Deusa, depois de se deleitar lendo essa news, que tal encaminhar para uma amiga que também merece sentir prazer lendo esse conto?
— Sugestão Lasciva
A sugestão de hoje é o ensaio Usos do erótico: o erótico como poder, da escritora e ativista Audre Lorde. O conto de hoje tem tudo a ver com o que Audre discorre no ensaio, que é um dos meus escritos favoritos da vida. Você pode ler o ensaio completo aqui.
— DIÁRIO, abril de 2024
Voltei a ver a vida com olhos de poesia e a minha criatividade, que andava seca, floresceu de novo. Voltei a escrever, colocar em palavras minhas reflexões sobre corpo, prazer, sexo, amor. Tudo que pra mim é deliciosamente sagrado e cheio. Um novo livro está nascendo e o processo criativo tem gosto de renascer, afinal, escrevo sobre o que aviva.
Prazer, sexo, amor, não são temas menores, são imensos, ocupam o corpo inteiro, tiram o sono, seja por gozo ou por angústia. E meu desejo feroz é ajudar a aliviar a angústia e aprofundar o gozo. É assim que nasce o meu Livro de Reflexões Lascivas. E logo mais você vai poder se deliciar com ele, que vem ao mundo no dia 17 de abril!
E não só isso, para celebrar esse lançamento, as primeiras compradoras vão ganhar também ingresso à Master Class ao vivo e exclusiva “O prazer como caminho: sobre reencontrar a poesia perdida”.
— Ritual para sentir
Quero sugerir um exercício simples para ver com olhos de poesia: pause um momento em frente a algo que você vê todo dia, pode ser a vista da tua janela, uma árvore que floriu na rua, teu reflexo no espelho. E por um instante, que pode ser breve, respire fundo e olhe, olhe com atenção. Numa folha de papel ou nas notas do teu celular, encontre palavras para descrever a beleza do que você vê. Faça um esforço se for preciso. Resista à tentação de diminuir a beleza, deixe ela entrar em você. É simples, mas pode ser fundo.
— Para dar replay
Ainda para celebrar o nascimento do meu novo Livro de Reflexões Lascivas, criei uma série para dar um gostinho do que você vai encontrar nele. Ficou curiosa? Clica para ver o segundo episódio:
— Curadoria Lasciva
para te nutrir de erotismo
Arte:
Palavras:
Música:
O que você sentiu lendo essa edição da news? Deixe um comentário, vamos conversar!
que delícia, o comecinho principalmente. lendo, sentindo e pensando que é mesmo hora de um conto ser sobre fazer gozar o próprio corpo. amei muito!
Aii, tô tão ansiosa pra esse livro lascivo!!!